Em maio de 2024, de maneira ambientalmente correta e bem planejada, foram removidos os ninhos de caturritas que estavam afetando a iluminação no Centro de Desportos (CDS) da UFSC. Embora tenha sido um processo demorado, todas as etapas percorridas foram essenciais para garantir a conformidade com a legislação ambiental e o bem estar e integridade dos animais.
Caturritas
A Caturrita (Myiopsitta monachus) é uma espécie de periquito robusto, caracterizada por sua coloração verde com nuances de azul, cabeça e pescoço acinzentados, faixas brancas no peito e bico amarelo. Essas aves preferem ha
Fonte: Wikipedia (https://pt.wikipedia.org/wiki/Myiopsitta_monachus)
bitats abertos como campos e áreas urbanas, onde utilizam árvores altas e estruturas como postes e torres para nidificação, construindo ninhos de gravetos que servem não apenas para a reprodução, mas também como abrigo contínuo para o casal. Esta é a única espécie de Psitacídeo conhecida que faz ninho desta maneira.
A construção dos ninhos assemelha-se a uma chaminé, feita de galhos secos, folhas e até mesmo arames encontrados em ambientes urbanos. Essa espécie é conhecida por formar colônias de 4 a 8 casais próximos uns dos outros.
Um exemplo de pressão urbana sobre fauna silvestre
A adaptação a ambientes urbanos e as intensas supressões arbóreas neste, em especial as de grande porte, tem levado ao uso de estruturas humanas para construir seus ninhos, como observado na pista de atletismo do Centro de Desportos (CDS) da UFSC, onde as estruturas dos refletores foram utilizadas como suporte para os ninhos desses animais.
Apesar de não constar em categorias de ameaça de extinção nas listas oficiais estaduais e federais, as caturritas são protegidas por lei no Brasil, o que proíbe atividades como caça e captura sem autorização (BRASIL, 2014; Lei 9.605/1998; Lei N° 5.197/67). No contexto atual, estratégias de manejo incluem a remoção dos ninhos vazios e a implementação de medidas de afugentamento para evitar a recorrência da nidificação em estruturas inadequadas, visando o equilíbrio entre a preservação da espécie e a convivência urbana.
Retirada dos ninhos dos postes
No campus UFSC Trindade, os ninhos de caturritas encontrados nos postes ao redor da pista de atletismo do CDS estavam gerando uma série de desafios para a comunidade universitária. Podemos destacar o impedimento da realização de manutenção técnica adequada, representando diversos riscos à segurança e aos recursos financeiros, como curtos-circuitos e potenciais incêndios nos ninhos devido ao calor dos holofotes. Por causa desses problemas, os postes com ninhos estavam desligados.
O CDS é frequentado por milhares de pessoas diariamente, incluindo estudantes, professores e profissionais ligados à universidade, tanto para atividades esportivas quanto como rota de entrada e saída da instituição. A falta de iluminação gerava insegurança entre os passantes, comprometendo o direito de ir e vir de uma parte significativa da comunidade da UFSC.
Além dos transtornos no trajeto dos passantes, havia também impactos negativos nas atividades realizadas na área. As aulas e treinos nas pistas de atletismo eram prejudicados em condições de baixa luminosidade, o que representava um risco aumentado, especialmente para pessoas com deficiência visual que dependem de boa iluminação para sua segurança durante a prática esportiva. Essas questões estavam sendo enfatizadas por professores do CDS, que já testemunharam incidentes relacionados à falta de iluminação, inclusive um acidente envolvendo alunos com baixa acuidade visual.
Manejo
Para resolver esses problemas e restaurar a iluminação necessária para a prática esportiva e segurança noturna, a CGA coordenou e implementou um plano de manejo adequado aos ninhos aprovado por órgão ambiental competente. Não obstante, a remoção dos ninhos de caturritas envolveu uma série de etapas e enfrentou diversos obstáculos ao longo de um ano, que atrasaram significativamente o processo.
Após a solicitação de retirada das caturritas pela manutenção da UFSC e Diretoria do CDS, a Coordenadoria de Gestão Ambiental (CGA) da UFSC entrou em contato com a Simbiosis Empresa Júnior, que elaborou, com auxílio de especialistas, como o Professor Guilherme Brito um Plano de Manejo, planejamento básico para situações como essas. Após a análise do Plano, o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (IBAMA) autorizou a retirada dos ninhos das aves. No entanto, antes que a remoção pudesse ser realizada, houve um surto de gripe aviária e como medida de precaução, o IBAMA suspendeu temporariamente a autorização, atrasando o cronograma inicial.
Retirada nos ninhos
Nesse interstício, a CGA continuou incessantemente na busca por alternativas. Realizaram-se reuniões internas e buscou-se colaborações externas para o recebimento efetivo dos animais (filhotes), a citar, com o IMA/SC, hospitais veterinários da UFSC em Curitibanos e da UDESC, em Lages.
Em abril de 2024, o IBAMA emitiu nova autorização, condicionando o transporte dos filhotes encontrados para o Centro de Triagem de Animais Silvestres (CETAS) em Porto Alegre, no Rio Grande do Sul. Contratou-se uma empresa especializada para realizar a retirada dos ninhos, no entanto, antes que a operação pudesse ser concluída, outro obstáculo surgiu: a tragédia das enchentes no Rio Grande do Sul, impossibilitando temporariamente o recebimento das aves.
Finalmente, em maio de 2024, período de não reprodução dessas aves, os ninhos das aves foram retirados sob a supervisão da Coordenadoria de Gestão Ambiental, com a participação do biólogo Allisson Castro,do professor Guilherme Renzo Rocha Brito, do médico veterinário Marco Antônio de Lorenzo, ajuda de estagiários, além do suporte de equipes de transporte, manutenção e segurança da UFSC, e de técnicos da CIDASC. O apoio do Biotério Central da UFSC foi essencial, com o engajamento do médico veterinário, a disponibilização de materiais, equipamentos, e local limpo ambientando para possíveis filhotes encontrados, bem como a disponibilização de transporte com qualidade térmica para a longa viagem que seria realizada até Porto Alegre.
Antes da realização da retirada, foram distribuídos informativos à comunidade no local, explicando o porquê da sua realização. Durante a operação, constatou-se que não havia nenhum filhote nos ninhos. Após a remoção, foram implementadas medidas preventivas para evitar o retorno das aves, destacando-se as fitas reflexivas, feitas com CDs, além de ter sido informado aos setores envolvidos, por meio de Ofício, as competências para acompanhamento das torres, visando que a nidificação não ocorresse novamente.
Desafios contemporâneos
Esse processo ilustra a complexidade e os desafios envolvidos na gestão de espécies de animais silvestres em áreas urbanas, especialmente quando se trata de conciliar as necessidades humanas com a preservação ambiental. A remoção das caturritas foi um esforço coordenado que exigiu planejamento meticuloso, cooperação entre diversas entidades e adaptação a circunstâncias imprevistas, para garantir o bem-estar dos animais e o uso das estruturas da UFSC. No decorrer do processo foram observados locais para possível guarda temporária, alimentação adequada, frequência, temperatura, ambiente com itens para minimizar estresse e viabilizar a melhor adaptação, pessoal necessário, operadores técnicos com conhecimento para a espécie, veterinário, biólogo, seguranças, envolvimento de órgãos sanitários, e o cuidado com a informação para a comunidade acadêmica são essenciais. Tudo isso para garantir a integridade das aves e o uso das pitas de atletismo.